21 dezembro 2016

SOBRE O AMOR E OUTROS LOUCOS E MARAVILHOSOS ESTUDOS ( II )


























Não pretendendo ser mais que um qualquer filósofo ou algum mestre nas técnicas da poesia, limito-me àquilo que sou, um ser humano, simples, nem melhor nem pior que ninguém, apenas igual a mim mesmo, e se escrevo é porque admito que dos meus pensamentos sobre as ideias, as pessoas e as coisas, de vez em quando sai algo que pode merecer não ser despejado de qualquer jeito na lixeira municipal.

E escrever sobre o amor, deve ser mais fácil do que descrever uma explosão atómica, ou desenrolar face a um ou outro leitor, se o tiver, as estratégias que levaram Napoleão Bonaparte a adoptar e o perderam na Batalha de Waterloo. O amor não é matemático não me exige fazer demonstrações, desenrolar fórmulas, efectuar cálculos. Não parece que seja uma doença do discernimento dos sentidos, embora bastantes vezes pareça, razão pela qual a afasto dos que estudaram medicina e percebem imenso de corpos mas revelam, muitas vezes, uma miopia acentuada quando se tratam de coisas da alma.

Os seres de vergonha, os académicos legítimos, e os licenciados, bacharéis e doutorados alicerçados em estudo e não em compras de diplomas, os alquimistas, astrólogos, e outros especialistas abordam este assunto do amor, como se fosse uma coisa tangencial ao homem, alguns aceitarão que possa tratar-se de uma secante que mais ou menos entra no ser em estudo, mas poucos conseguem explicar ou ir tão longe e dizer que o amor é a verdadeira essência do homem. Como argumentar em defesa de uma teoria que parece fugir das ciências, tanto das exactas quanto das humanas, como do simples bom senso, ou senso comum, existente na grande maioria das pessoas que pelo menos uma vez na vida se interrogaram sobre, em verdade, que coisa é esta do amor, e o que pode tornar de especial num ser humano padrão o facto de estar ou não apaixonado, de ter ou não conhecido o amor, e o que se pode sentir ou não sentir tendo o amor na e ele se perder em seguida.

Os livros que encontramos nos aeroportos, tão parecidos aos próprios aos aviões, é para passar rápido, 5 aulas e um amor para toda a vida, 10 posições para a fazer mais feliz, como ter 7 orgasmos em 3 horas, seduza uma mulher em 45 minutos, praticamente solucionam todos os problemas e tornam o amor a coisa mais simples do mundo. Bastam meia dúzia de euros, o meio tempo de viagem, e a humanidade pode voltar-se para outros assuntos que de amor, o mundo inteiro sabe, o mundo inteiro lê, tudo é coisa do passado.

Procuramos pelo mais simples, deve ainda levar menos tempo a ler e deve ser mais barato, o que é o amor, características do homem apaixonado, uma vida sem amor... esgotaram. Não se encontram em lugar nenhum.

Só isso pode explicar que de facto alguns seres humanos - difícil lançar um número e entrar no especulativo, mas arriscaria numa meia bola, isto é, numa metade, - nunca conheceram o amor, e admitindo que sejam dele filhos, e por seres de amor criados, e casados, pais, avós e falecidos, nunca tiveram a felicidade perigosa, agitadora, descontrolada, desmedida de encontrar um amor dentro de si e que como um vulcão enfurecido deseja seja como seja lançar toda aquela lava num desejável outro vulcão também transfigurado e fervilhando entre labaredas sem fim.

O ser humano normal é mais parecido com o funcionamento de um relógio suíço do que com um carro que leva horas sem parar percorrendo desenfreado uma montanha russa. Muitos homens nem sonham o que é andar de montanha russa, e todos esses e mais alguns não colocam de jeito nenhum o rabo num carro daqueles. O bater certinho do relógio helvético impõe à grande maioria dos corpos que dominam limites de risco estreitos, sem atrevimento aventureiro, sem audácia ou temeridade. o que os afasta inevitavelmente da pista da montanha russa e os leva mesmo a não olhar para os tresloucados carros fazendo piruetas e andando ora para cima ora para baixo, a pique, a velocidades estonteantes.

Este exemplo pareceu-me a maneira mais fácil e compreensível de explicar porque grande parte dos seres vivos humanos nascem, crescem, se reproduzem e perdem a vida sem nunca ter encontrado o amor. Estiveram bem, cresceram sem problemas, estudaram e tiraram os seus cursos e se dedicaram às suas profissões, casaram, havia alguma coisa que os aproximava, dai resultando filhos, e foram sempre cuidando da vida, mil cuidados, sobretudo com o coração, fazer ginástica, um pouco de exercício, uma dieta equilibrada e uma consulta no médico de confiança de seis em seis meses. O relógio parecia dos novos, já com pilhas, ou sem delas necessitar durava, durava e lá deixava de trabalhar depois de uma longa vida sem avarias nem falhas.

Mas esse ser humano teve do amor uma visão ilusória, ou não viu nada sequer nem imaginou, pelo que teve longa vida, e pode ter sido muito feliz, e não precisou de amor nenhum para viver melhor.

Quanto ao ser humano que embarcando no carro da montanha russa ou se foi estatelar em algum lugar, ou não conseguiu libertar-se do carrinho e continua a circular sempre nas mesmas voltas descontroladas e de meter medo, ou apavorado segue agarrado de pés e mãos a tudo o que pode não vá ser catapultado com tanta reviravolta, com tanta manobra inimaginável que o carro sempre faz e quando menos se espera.

Esse ser humano gritou, gemeu, fechou os olhos, esperneou, agarrou-se com toda a força, pulou, sentiu o coração querer saltar do peito, e o sangue subir à cabeça, as pulsações guerrearem entre todos os tipos de limites, e sentiram o estômago a dar voltas, os intestinos à solta. E desde que pôs os pés no carrinho fatal nunca mais existiu uma pulsação regular, uma tensão arterial dentro das regras, descanso, serenidade, uma vida como deve ser vivida e levada a a sério para ser durável e de melhor qualidade. Este é, sem qualquer sombra de dúvida, o homem que no seu percurso de vida encontrou o amor. 

Um bateu de menos e acabou trabalhando mais, durou imenso e nunca teve problemas.

Outro nunca mais deixou de bater, de toda a maneira e modos, pelo que trabalhou muito menos, passou pela vida parecia um foguete, e a sua vida foi uma constante movimentação, excessos, mazelas, cambalhotas, estados febris e algumas doenças, acabou saindo da vida cedo demais.

A natureza das coisas exige um balanço, algo técnico, erudito, coisa de intelectual. É que levanta-se a questão, e merece ser estudada e desenvolvida, qual o homem viveu melhor a vida que teve de viver, o que alheado do amor e do seu conhecimento efectivo, se aquele que o tendo conhecido não mais se conseguiu apartar, tendo-o efectivamente, ou o recordando.




11 dezembro 2016

SOBRE O AMOR E OUTROS LOUCOS E MARAVILHOSOS ESTUDOS ( I )






















Falar sobre o amor afigura-se uma tarefa não muito facilitada, afinal os maiores poetas, os maiores pensadores, os estudiosos das coisas da mente, já escreveram imensas definições, estudos, interpretações, modos de estar e de sentir, quando o amor existe no coração do homem.

Deixaria aqui um soneto do nosso maior poeta que nos mostra de uma maneira sábia, conhecedora, experimentada, e com a musicalidade poética que só a poesia tem, descrevendo o amor, e nos mostrando de um modo claro a complexidade que é possuí-lo, vivenciá-lo, tê-lo possuindo todo o corpo e toda a alma:



Amor é fogo que arde sem se ver ...


de Luís Vaz de Camões

Amor é fogo que arde sem se ver,
é ferida que dói, e não se sente;
é um contentamento descontente,
é dor que desatina sem doer.

É um não querer mais que bem querer;
é um andar solitário entre a gente;
é nunca contentar-se de contente;
é um cuidar que ganha em se perder.

É querer estar preso por vontade;
é servir a quem vence, o vencedor;
é ter com quem nos mata, lealdade.

Mas como causar pode seu favor
nos corações humanos amizade,
se tão contrário a si é o mesmo Amor?
 















Esta poesia tem em si tanto de maravilhoso quanto de enigmático, e traduzindo o poeta ficamos divididos entre o ser e não ser, o intenso e a leveza, o que dói e se não pode sentir, a perca de liberdade para sair livre, é dar-nos ao inimigo, enfim, é tudo aquilo que em boa razão se não pode explicar em modos científicos, e acontece algumas vezes na vida dos seres humanos. Amar é ter no coração, e sentir em todo o corpo pois é tal e qual como o sistema circulatório que leva e traz do corpo todo ao coração e o seu contrário, é um estar vivo de modo diferente do que habitualmente era a nossa vida, é não ter barreiras e ao mesmo tempo estar aprisionado, é uma amálgama de milhentas coisas maravilhosas e fantásticas com momentos de angústia, tristeza, dúvida, incerteza.
Ouvimos o que Luís de Camões escreveu no seu célebre poema sobre o amor. A visão do poeta, do homem conhecido que foi um enamorado militante, que fez da sua vida mil e uma tropelias e correu riscos por seus intensos amores. Obviamente é um analista tendencioso, mas foi um homem que viveu o amor como poucos. Vamos ouvir um pensador filósofo que também escreveu nas suas obras várias vezes sobre o amor, esse, que ao contrário do poeta, viveu uma vida atribulada de amores impossíveis, pelo que acabou por sentir fortemente e impiedosamente o que é estar enamorado, mas não obteve o supremo bem de receber a almejada correspondência por parte de sua amada:

Aquilo que se faz por amor está sempre além do bem e do mal.

Há sempre alguma loucura no amor. Mas há sempre um pouco de razão na loucura.

O amor é o estado no qual os homens têm mais probabilidades de ver as coisas tal como elas não são.

A sensualidade ultrapassa muitas vezes o crescimento do amor, de forma que a raiz permanece fraca e arranca-se facilmente.

A melhor cura para o amor é ainda aquele remédio eterno: amor retribuído.

A exigência de ser amado é a maior das pretensões.



Bastaria focar a atenção na última frase para perceber toda a importância e intensidade do amor na vida do homem, Nietzsche declara que a exigência de ser amado, de receber amor, de ter o direito maior, é entre todas a maior das pretensões do ser humano. E coloca o amor numa dimensão elevadíssima como expressa, e bem, que tudo aquilo que um homem faz enamorado, louco de amor, apaixonado, fica muito longe do que é o bem e do que é o mal, é algo que não cabe nestas bitolas, simplesmente as ultrapassa. E como o amor é loucura, diz-nos o filósofo, o homem apaixonado tem imensas probabilidades de não discernir em rigor, do mesmo modo se a sensualidade que rodeia esse amor o vai enfraquecer, levando a tornar-se quebradiço, a perder a potencia que vem da alma, e a morrer. O filósofo alemão reforça ainda a ideia da sua última máxima quando descreve com uma simplicidade simplesmente rigorosa que a cura para o amor só pode ser - o eterno remédio - de um amor retribuído. No fundo não existe contradição entre o aventureiro poeta português que levou uma vida atribulada precisamente por se ver envolvido em amores muitas vezes não permitidos, e o célebre filósofo que entre a sua obra imensa, em que que tudo questionou, tudo colocou em causa, e como um sistema novo, revolucionário avançou com a filosofia moderna, no que respeita a esse fenómeno que ataca a alam e o corpo do homem, o apanha, o suga, o escraviza, e lhe dá algo que parece inexplicável que arde e não se vê e parece estar para além do bem e do mal.







04 dezembro 2016

COMO O PODER ADORA A NORMALIDADE, A ESTABILIDADE



SEM DÚVIDAS 
SEM REVOLUÇÕES 
O MUNDO É 
O QUE DEVE SER














Não é a normalidade que provoca movimentos revolucionários capazes de alterar o caminho do mundo ou o rumo dos homens, ou mesmo, simplesmente a vida de um homem.

O que é meramente normal, podemos defender como tudo aquilo que não tem nada em si de diferente do que é, do que foi e potencionalmente do que será. Não produz mudanças, alegrias, metamorfoses, conquistas, realizações fecundas, não contribui para o progresso nem para o movimento do mundo, do homem ou da vida.

O que é meramente normal é o ser aprisionado num quotidiano sem emoções, sem dúvidas, sem perguntas, sem interrogações. É deixar que o mundo siga paulatinamente o seu caminho e a terra não deixe de girar sobre si e em torno do sol, é acreditar que o sol desponta cada manhã, que depois do dia vem a noite, que pode chover ou fazer sol, que existem noites com e sem estrelas, com e sem lua, e que a vida é passar um gigantesco número de dias, menos de meses, e muito menos de anos, até que um dia, o último se dá o apagão e termina tudo.

Existem pessoas totalmente normais. Tudo que vai marcando a sua existência é normal, as circunstâncias são absolutamente sem motivo de particular atenção, e tudo decorre como deve decorrer, o homem nasce, cresce, se casa, tem filhos, os educa e os vê crescer, casa os filhos, vai envelhecendo e morre. Tudo normal, sem acidentes, sem problemas especiais, sem crises nem conflitos, sem perguntas ou reflexões.

Uns sustentam que essas pessoas foram felizes, foram protegidos pela sorte e nunca tiveram sobressaltos. Tudo nas suas vidas decorreu como devia ser. Na sua jornada pela existência terrena passaram serenos, sem beliscar seja o que pudesse ser, sem ser alvo de qualquer vicissitude que pudesse criar um conflito, um problema, uma crise com apreciáveis consequências. Não conheceram a adversidade, inimigos, ser alvos da maldade ou da inveja, estiveram sempre afastados dos conflitos, da violência de qualquer confronto. Também nunca foram seduzidos por ideais, por desejos, por paixões, por sonhos, por sentimentos interiores de repúdio, revolta ou vontade de mudar alguma coisa. Não lutaram por nada e nada lhes pareceu suficientemente questionável para que tivessem de tomar posições firmes ou tivessem de mobilizar-se para uma qualquer batalha. O mundo lhes pareceu existir rigorosamente como deveria ser. E de igual modo sentiram a vida, sua e a dos outros, mesmo que, como seria natural, não fosse prioritário ou mesmo interessante olhar o outro. E eles mesmos percorreram a vida sem dúvidas, sem erros, tudo demasiado simples, de um modo que lhes fez sentir a felicidade e como a vida era boa.

Outros teorizam em sentido inverso; essa gente normal passa pela vida, somente, e quando morre, termina uma existência sem qualquer facto que mereça nota, passaram pela vida, existiram mas nem viveram nem chegaram a conhecer o mundo e a vida. Não viram os outros à sua volta nem se interessaram por eles, o mundo apenas lhes interessava na medida em que aí habitavam e vendo satisfeitas as suas poucas e pouco exigentes necessidades tudo se afigurava bem. Não tiveram dores de cabeça com filosofias, não andaram perdidos em reflexões, nem eram vítimas de dúvidas ou lamentavam erros cometidos, nem choravam as desgraças que aconteciam aos outros um pouco por todo o mundo. Não sofreram de amor, nem perceberam bem de que se trata esse fenómeno que parece inquietar e mover milhões de pessoas, mas em boa verdade, não sentiram isso, se casaram com quem lhes pareceu ser a melhor pessoa para viver, sem excessivos destemperos procriaram, e sempre mantiveram qualquer coisa que os fez estar bem com um outro, que nunca conheceram de verdade, mas que era companhia certa, na mesa, na cama e na escassa vida com os outros. Viveram em paz, tal qual como morreram. Tudo foi paz, tranquilidade, segurança, confiança, bem estar, tanto que parecem ter vivido num outro cosmos, indiferentes às tropelias, às inseguranças, à violência, aos problemas que assaltavam o seu semelhante, como o planeta, com a economia, com a política, com a justiça, com a fome, a droga, o crime, a corrupção, os valores, o pão, saúde. Em boa verdade, e eu defendo esta tese, não viveram, estiveram sempre alheados do mundo, da vida e dos outros, e por uma qualquer acção de autor desconhecido, nunca necessitaram sair de um casulo que os protegia e afastava da realidade, os mantinha mas lhes cerceava o conhecimento, os fazia superar cada dia sem que tivessem de lutar para obter fosse o que fosse, os fazia aceitar tudo como existia e era.

Estes seres normais são desejáveis, descartáveis, aceitam tudo, não complicam, não exigem, não reclamam. Com eles o mundo seria imaginável, apenas poderíamos nos equivocar no século onde colocar o homem. Não lhes faria diferença colocá-los no século XV, ou no século X, ou antes de Cristo. Tudo está bem. O mundo é o que deve ser. Existem.

Com as pessoas ditas normais, que infelizmente, são em número demasiado expressivo, não podemos esperar companheiros de mudança, de reivindicações, de progresso. Com eles, nem as guerras se justificariam, nem as causas, nem as ideias, nem os sonhos. Com eles o mundo não conheceria revoluções, seria sempre igual. E seria bom para todos os animais da terra, aí podiam existir plenamente, mas para o homem essa limitação a uma existência sem nada mais, é algo demasiado cinzento, sem brilho, sem cores. É uma tristeza.










A Gente Vai Embora 🙏🏼